CR7 terá desafio de enterrar maldição dos melhores do mundo em Copas
Desde o Mundial de 1994, nenhum jogador que chegou com status de melhor do planeta conseguiu levar sua seleção à conquista da Copa
Por Vinícius Guerreiro
Porto Alegre
Muita pressão, declínio técnico ou azar? Os questionamentos são vários. As respostas, nem tanto. O fato é que uma misteriosa coincidência é constatada há cinco Copas do Mundo. Desde o Mundial dos Estados Unidos, em 1994, o jogador que chega com o título de melhor do planeta pela Fifa não consegue corresponder e levar sua seleção ao título mundial. Dois tiveram boas atuações, como é o caso de Roberto Baggio, em 1994, e Ronaldo, em 1998, mas fracassaram na decisão. Os outros três - Luís Figo, em 2002, Ronaldinho Gaúcho, em 2006, e Messi, em 2010 - não conseguiram ser protagonistas. Agora, quem tem nas costas o peso da Bola de Ouro é Cristiano Ronaldo. Caberá a ele dar um fim a essa "maldição".
Mas, afinal, qual o motivo para a queda dos jogadores considerados tops logo na competição mais importante do mundo? Fatores psicológicos e uma atenção maior dos adversários podem explicar o mistério.
- Essa atenção extra de ser o Bola de Ouro também pode funcionar ao contrário. Os treinadores e marcadores adversários tendem a ter mais cuidado ao enfrentar um craque consagrado, e os marcadores estão motivados a fazer uma final de Copa do Mundo para anular esses jogadores. Outra possibilidade é o desgaste psicológico que esses atletas sofrem durante toda a temporada - afirmou Maurício Pinto Marques, doutor em Psicologia do Esporte pela Universidade Autônoma de Barcelona.
O desgaste psicológico e físico é, segundo Maurício, uma das principais causas da queda de rendimento na principal competição mundial. A exigência que sofrem esses atletas, por estarem disputando decisões nos principais campeonatos, faz com que o jogador chegue esgotado ao fim da temporada. Quando, então, inicia a Copa do Mundo.
- Uma hipótese é de que esses jogadores já cheguem bastante desgastados psicologicamente e fisicamente por virem de temporadas muito fortes em que renderam e isso pode refletir em um campeonato "intenso" como a Copa do Mundo. Mas também há que se considerar que o clube e a seleção são duas realidades distintas, é outro "time", e assim o papel do craque e sua função variam bastante.
Os cuidados de CR7
Cristiano Ronaldo chega à Copa do Mundo do Brasil na melhor fase de sua carreira. Artilheiro da Europa, conquistou a Liga dos Campeões com o Real Madrid nesta temporada. Em 2013, quebrou a hegemonia de Messi e foi eleito o melhor do mundo pela segunda vez na carreira. Em contrapartida, não está na sua melhor forma física. CR7 tem sofrido com lesões que o atrapalharam na reta final da temporada europeia.
Para Maurício, um trabalho psicológico prévio será fundamental para que o português consiga render em alto nível no Mundial.
- Um acompanhamento psicológico individual do atleta e suas questões pessoais, de como reagir sob pressão e buscar seu espaço na seleção, são importantes. É fundamental também trabalhar em grupo, com um trabalho com o elenco, lidando com os diferentes papéis dos jogadores, podendo até trabalhar o papel de protagonista do craque, ou ainda a divisão de responsabilidades.
Confira a trajetória em Copas dos outros melhores do mundo:
ESTADOS UNIDOS - 1994
O atacante italiano Roberto Baggio chegou aos Estados Unidos com o peso de ser eleito o melhor jogador do mundo pela Fifa em 1993. Na temporada anterior, 1992/1993, conquistou o título da Copa da Uefa pelo Juventus e passou a ser comparado a Michel Platini, ídolo da equipe. Os primeiros três jogos na fase inicial não tiveram boa participação do atacante. Baggio só passou a comprovar o status de melhor jogador do planeta a partir das oitavas de final.
A Itália chegou à decisão da Copa do Mundo contra o Brasil vencendo as oitavas, as quartas e as semifinais por 2 a 1. Nas três partidas Baggio balançou a rede. Contra a Nigéria, fez dois gols que deram a vitória à Azzurra, de virada. Nas quartas, frente à Espanha, abriu o placar. Foi novamente decisivo diante da Bulgária de Stoichkov, artilheiro daquele Mundial, marcando os dois gols italianos. Foram cinco marcados e a vice-artilharia da competição.
A “maldição” apareceu pela primeira vez sobre o melhor jogador do mundo na grande final da Copa do Mundo de 1994. Apagado durante todo o tempo regulamentar, Baggio ainda acabou colocando por cima do gol de Taffarel o sonho da Itália de conquistar o tetracampeonato. A cobrança do atacante italiano, nas penalidades que decidiram a Copa, ficou marcada na história da competição. Baggio bateu muito mal, e a bola foi longe da meta brasileira.
- Nunca havia cobrado um pênalti por cima do gol. Acho que foi o (Ayrton) Senna que puxou aquela bola para o alto. Acredito que foi ele que fez o Brasil vencer. É uma ferida que nunca vai se fechar. Sempre sonhei disputar uma final de Copa do Mundo, e o rival dos meus sonhos era o Brasil. Quando tive a oportunidade, desperdicei aquele pênalti. Na hora, quis cavar um buraco para me esconder. Depois, pensei que, como o Brasil tem muito mais habitantes que a Itália, eu fiz mais gente feliz com aquela cobrança – disse o atacante, em 2010, em entrevista para o "Esporte Espetacular".
FRANÇA - 1998
O Brasil desembarcou na França em busca do pentacampeonato como franco favorito. Não tinha Romário, craque da Copa do Mundo de 94, lesionado. Mas contava com Ronaldo, que ganhara a alcunha de “Fenômeno” pelos gols nas duas temporadas que antecederam o Mundial. O camisa 9, que se tornaria ao longo dos ano o maior artilheiro dos Mundiais, chegou com a credencial de ser o melhor jogador do mundo nos anos de 1996 e 1997.
A seleção brasileira conseguiu avançar até a decisão contra os anfitriões. Ronaldo marcou quatro gols antes da final.
Porém, na véspera da decisão, uma estranha notícia assustou os torcedores brasileiros. Ronaldo estaria fora da decisão contra a França. O jogador havia sofrido convulsões durante a noite, e Edmundo iria começar a partida. Antes de a bola rolar, o camisa 9 foi confirmado em campo. Segundo o departamento médico, estava apto para disputar a final. Não foi o que se viu dentro do gramado. Ronaldo, assim como o restante da equipe, não teve boa atuação, e viu Zidane & cia. darem o título mundial para a França.
COREIA E JAPÃO - 2002
Um português era o principal astro da primeira Copa no continente asiático. Luís Figo, que havia trocado o Barcelona pelo Real Madrid para conquistar a Liga dos Campeões da Europa em 2001/2002, tinha a missão de levar Portugal longe na Copa do Mundo.
Passar da primeira fase parecia a menor das missões. A equipe lusitana estava no Grupo D ao lado de uma anfitriã, a Coreia do Sul, e dois países sem expressão no futebol mundial: Estados Unidos e Polônia. Figo não estava em sua melhor forma física. Prova é que o meia não marcou um único gol nos três jogos. De quebra, viu Portugal ser eliminado com duas derrotas para os americanos e coreanos.
Em 2012, o meia desabafou em entrevista ao site da Federação Portuguesa de Futebol.
- A nossa presença no Mundial de 2002 foi um desastre em todos os sentidos. Eu me encontrava meio lesionado, com uma situação complicada, e o meu rendimento desportivo não foi bom. Foi duro – afirmou.
ALEMANHA - 2006
Pentacampeão com o Brasil em 2002, Ronaldinho Gaúcho era o principal astro do chamado quadrado mágico do time canarinho. Ao lado de Kaká, Adriano e Ronaldo, Gaúcho chegava à Alemanha credenciado como o melhor jogador do mundo por dois anos seguidos. Ídolo do Barcelona, Ronaldinho tinha acabado de ganhar aplausos até da torcida do maior rival, o Real Madrid, em pleno Santiago Bernabéu.
Camisa 10, Ronaldinho tinha o peso de ser pela primeira vez o grande protagonista da seleção brasileira. Algo que não conseguiu. O Brasil chegou até as quartas de final e acabou eliminado pela França liderada por Zidane. Gaúcho passou os quatros jogos anteriores sem marcar um gol. As incríveis arrancadas e jogadas individuais não foram vistas.
A eliminação na Copa da Alemanha iniciou o declínio na carreira de Ronaldinho. Ao retornar para o Barcelona, acabou negociado na temporada seguinte com o Milan. O brasileiro não conseguiu repetir as boas atuações na Itália e retornou ao Brasil em 2011 para defender o Flamengo.
ÁFRICA DO SUL - 2010
O argentino Lionel Messi havia disputado a Copa da Alemanha e chegava à África do Sul como astro do Barcelona. Eleito melhor do mundo em 2009, Messi conquistou na temporada que antecedeu o mundial seis taças com o Barcelona, inclusive a Liga dos Campeões.
A aposta argentina era tanta em seu camisa 10 que o escolhido para treinar a equipe foi Maradona. O pensamento da Federação Argentina era que o maior ídolo do futebol argentino motivaria a equipe para correr por Messi. Porém, Lionel não foi capaz de fazer a diferença para os hermanos. Inclusive, conhecido por ter recorde de gols com a camisa do Barcelona, o camisa 10 da Argentina não marcou sequer um gol na campanha que terminou nas quartas de final. Messi viu a Argentina ser goleada pela Alemanha por 4 a 0.
De positivo para os argentinos fica que, desde a Copa de 2010, a carreira de Messi cresceu. O camisa 10 acabou sendo eleito mais três vezes o melhor jogador do mundo. Só em 2013 o craque não levou o troféu. Por isso não chegará com a pressão de ser o maior astro do futebol mundial na Copa do Brasil deste ano.